quinta-feira, 17 de setembro de 2015

Folha: Senna Agride Repórter Depois de Ver 'Herói Por Acidente' 01 05 1993


Piloto danifica equipamento do fotógrafo e grita 'vai procurar sua turma'


Folha de São Paulo
01 de maio de 1993

O tricampeão mundial de Fórmula 1 Ayrton Senna agrediu ontem à noite o repórter Otavio Cabral, 21, do jornal “Notícias Populares” e danificou o equipamento do fotografo Sérgio Andrade da “Folha da Tarde”.

Senna saia do cinema Liberts na avenida Paulista, às 21h45 depois de assistir o filme “Herói por Acidente”, acompanhado da modelo Adriane Galisteu, da agência Elite.

Ao se deparar com os jornalistas, Senna reclamou que os jornalistas estavam invadindo sua privacidade. O repórter perguntou se eram verdadeiros os rumores de que a modelo Marcella Prado estaria esperando um filho do piloto, “Vai se foder, vai procurar sua turma”, gritou Senna.

Em seguida o repórter falou que estava trabalhando, “Trabalhando o caralho”, retrucou Senna, desferindo um tapa na orelha de Cabral. Na seqüência, tomou a máquina fotográfica de Andrade e atirou-a na parede com força. Depois, ainda chutou o equipamento.

“Eu não posso me divertir que a imprensa vem atrás. Vocês vivem me caluniando. Primeiro dizem que eu não sou homem. Agora, inventam essa gravidez. Me deixem em paz”, gritou.

Enquanto o fotografo recolhia as peças da máquina, Senna exigiu que lhe fosse entrega o filme. Andrade deu um filme virgem ao piloto, que desenrolou a bobina. Os jornalistas se retiraram em seguida.

A modelo Adriane Galisteu conheceu Senna na boate Limelight, na festa da vitória do Grande Prêmio Brasil de 93, conquistado pelo brasileiro. Dias depois, Adriane viajou com ele para Angra dos Reis, onde passaram um fim-de-semana juntos. “Somos apenas bons amigos”, disse Adriane quando voltou para São Paulo. 

Uma correção:  Nessa matéria cita que Adriane Galisteu conheceu Ayrton Senna na boate Limelight, essa informação está errada, na verdade Adriane conheceu Ayrton no Grande Prêmio do Brasil 1993 de formula 1, realizado no autódromo de Interlagos, em São Paulo. No mesmo dia, ela foi na festa da vitória do GP Brasil 93, na boate Limelight, onde reencontrou Ayrton Senna.









Adriane cita o episódio em seu livro “Caminho das Borboletas”

Falamos uma hora e meia. Não disse uma palavra sobre a prova. Disse mil palavras sobre saudade, pressa de voltar, planos de me encontrar. Imaginem: eu estava num paraíso mas só pensava no meu amor. Vontade de  voltar rápido, rápido. E, de fato, dois dias depois nos encontramos no apartamento dele, da Paraguai, dispostos a recuperar o tempo perdido naquela semana de separação. Estávamos em clima total de namorados e, para isso,  nada melhor do que o escurinho de um cinema. Ele escolheu: Dustin Hoffman, paixão total do meu moço. Filme:  Herói por Acidente.

Meia dúzia de espectadores, no Cal Center - maravilha para um filme a dois. A saída, esperava por nós o inferno. Ayrton é dono de uma paciência oriental para com os fãs mais ansiosos. Mas não tolera o jeitão trêfego e insolente de uma certa imprensa. Fomos, de repente, sitiados. Ouvimos o primeiro clique - e ele segurou com força minha mão. Outro flash. Ele quis dialogar:

- Olha, eu vim aqui em busca de tranqüilidade. Podemos ir todos embora agora, não podemos?

Enquanto ele argumentava, novo flash. E a perigosa aproximação de um rapazinho, de bloco e Bic na mão, trazendo na ponta da língua aquele veneno que só as cascavéis e alguns jornalistas conseguem destilar:

- Essa história da gravidez da Marcella Prado... Afinal, a filha é sua ou não é?

Tipo da pergunta elegante para um sujeito que tinha uma namorada ao lado. Pela primeira vez, pressenti que ele ia dar vazão ao seu pedaço Incrível Hulk:

- Pergunte ao seu pai. - E, antes que o repórter puxasse o argumento "é meu trabalho", já levou um safanão que o derrubou. Ao fotógrafo, ele lascou um tapa na orelha que até hoje deve lhe soar como um telefone ocupado. Arrancou-lhe a máquina e a arremessou contra o vidro do cinema. Juntou gente e eu não sabia o que fazer. Segurei-lhe na mão, gelada, que tremia, e tentei arrastá-lo. Mas ele estava transtornado. Voltou atrás sobre seus passos:

- Me dá o filme.

Fotógrafo e repórter gaguejavam. Passaram-lhe um rolo, que ele puxou e expôs à claridade. Arremessou contra uma cesta de lixo. Caminhamos para a porta e ele ameaçou voltar:

- Cachorro! Tenho certeza de que o filme é outro. Era outro.

Um homem capaz de percorrer uma pista tortuosa a 350 quilômetros por hora caminhou até o carro com o rosto respingado de lágrimas, e ele chorava, chorava, até seu apartamento - chorava de raiva, chorava pela impossibilidade de ser um mero mortal como os outros, chorava com a indelicadeza daqueles que fazem de uma profissão bonita um ofício de abutres, chorava por ser indefeso, chorava por me expor, chorava pelo controle perdido, arrependido de entrar no jogo dos achacadores de novidades. Mais de uma vez eu o vi chorar. Nunca de medo. Sempre de raiva. Ele se metia nas brigas e, depois, se envergonhava. Mas, num mundo de má-fé, a lei dos punhos acaba tendo de se impor, às vezes. Chorei com ele. Percebi, ali, que já vivia plenamente a vida dele.



FONTES PESQUISADAS

FOLHA DE SÃO PAULO - Senna agride repórter depois de ver ‘Herói por Acidente’. Folha de São Paulo, São Paulo, 01 de maio 1993, p. 8.


GALISTEU, Adriane. Caminho das Borboletas. Edição 1. São Paulo: Editora Caras S.A., novembro de 1994. 


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